A desapropriação e tombamento da Igreja da CIA Inglesa em Gália-SP

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Essa semana fizemos um pedal noturno e nos deparamos com uma placa de desapropriação e tombamento ao redor de 10 mil metros da Igreja da antiga CIA Inglesa que foi colocada pela Prefeitura de Gália-SP. Esse pode ser um importante passo do poder público para a sua restauração.

Agora vamos aguardar ver se serão adotadas medidas para a proteção e restauração desse patrimônio histórico incrível de nossa região ou se permanecerá a contagem regressiva para o seu desabamento sem que nenhuma providência a mais seja tomada.

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Infelizmente, nesse caso, o tempo está jogando contra. É rezar para que as estruturas em frangalhos da Igreja aguente esperar todos os trâmites burocráticos e a destinação dos recursos necessária para que o local possa ser recuperado e voltar a receber visitas com segurança. Se assim for, o local poderá continuar a ser um grande atrativo turístico da região.

Após a postagem desse texto no Instagram do @piramamtb, recebemos com satisfação o seguinte comentário do perfil no Instagram da Prefeitura Municipal de Gália-SP:

Agradecemos a preocupação e o carinho que vcs tem com a Igreja da Cia. Inglesa. Bom mas vamos lá, a placa que vcs instalaram, não sabemos o que aconteceu, não foi a prefeitura que removeu pois sabemos que a Igreja recebe grande número de visitantes toda semana, só instalamos nossa placa como está na foto. A respeito do Tombamento, como já foi divulgado em nossas redes sociais já criamos a lei que tombou esta Igreja como patrimônio histórico e cultural do município, o próximo passo foi fazer a desapropriação para tornar a Igreja do município e recentemente recebemos a imissão de posse, possibilitando que fizéssemos algo para assegurar a integridade das pessoas que por ali passam. Porém como é de se saber o município é pequeno e dispõe de poucos recursos; A prefeitura precisa angariar emendas na esfera estadual e federal para iniciarmos um processo de restauração (que não vai ficar barato). Esclarecemos ainda que em breve estaremos dando início a este longo processo, mas estamos abertos a receber todo e qualquer tipo de doação para auxiliar nisto, a momento estamos a passos lentos, mas não estamos parados e tão logo teremos o nosso e o vosso sonho realizado.”

O Piramba entende que se existe um objetivo comum, e por isso, seria interessante que o Poder Público, a Sociedade Civil e a Iniciativa Privada pudessem se unir por essa nobre causa em benefício a toda região que compreende não só Gália, mas Garça, Marília, bem como todo o Centro Oeste Paulista como o Interior de São Paulo. Quem sabe assim seja possível acelerar a preservação desse lindo patrimônio histórico que ao mesmo tempo contempla tanta história, e também é um grande atrativo turístico, já reconhecido pela população e muito visitado. Merece com muita razão toda a atenção e esforços conjuntos para que a merecida e almejada restauração da igreja da CIA Inglesa torne-se finalmente uma realidade que ajudará inclusive a economia dessa região do Estado de São Paulo.

Rudi Arena

Um Mergulho Profundo na História do Sanatório São Cristóvão em Campos do Jordão (SP)

Roots Bike Park, Onde Tudo Começou

Em viagem a Campos do Jordão fomos conhecer o Roots Bike Park Jordão e ganhamos de brinde uma verdadeira viagem no tempo, um mergulho profundo e impressionante num período da história recente e desconhecida das novas gerações. Se alguém contar hoje isso, para muitos vai parecer algo absurdo, mas existem provas materiais dessa época. Elas estão no Sanatório São Cristóvão que possui uma riqueza incrível de detalhes que nos faz viajar para um tempo muito diferente, que parece muito distante, mas não é bem assim.

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O Recanto São Cristóvão

O Roots Bike Park fica nas imediações do Recanto São Cristóvão que inclui também um moderno Hotel, uma pequena Igreja e a estrutura do que foi um grande sanatório para tuberculosos que parece congelado no tempo, uma vez que permanece quase tudo no mesmo lugar de quando foi desativado. Está localizado em uma área de 250.000 m2 de exuberante natureza à 1.700m de altitude, e cercado de um lindo cenário de montanhas, lagos, jardins, trilhas, muita vegetação e centenas de espécies de pássaros.

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Uma História Inimaginável nos Dias Atuais

Imagine você ser diagnosticado com uma doença infecciosa no pulmão e como tratamento terá que se internar em um sanatório em Campos do Jordão para se curar com o ar frio das montanhas, sem saber o tempo de duração. Hoje isso parece algo surreal, mas era muito comum no Brasil, algumas décadas atrás.

Desse período restaram louças, remédios, mobílias, aparelho de raio X. Tudo continua ali. O Sanatório São Cristóvão é uma espécie de museu dos sanatórios que existiram em Campos de Jordão. Eram mais 30 nos tempos difíceis. É possível conhecer a história do lugar e desse passado nem tão longínquo, ao se manusear os prontuários médicos ou uma antiga seringa de vidro, por exemplo. Ou então, ao percorrer os cômodos e toda a estrutura física que permanece ali intacta. O local transborda história e até parece que ela está viva ali e isso nos fez viajar profundamente para um período inimaginável para quem vive nos dias atuais.

Hoje a tuberculose é uma doença que pode ser tratada com modernos antibióticos e a impressão é que deixou de ser um grande problema de saúde pública. Antigamente o tratamento era demorado, custoso e muitas vezes ineficaz. Entretanto, a infecção continua a causar estragos; diminuíram as mortes pela enfermidade e isso é muito bom, mas ela permanece fazendo muitas vítimas fatais ao redor do mundo, inclusive no Brasil, como veremos mais adiante.

A Fase Sanatorial de Campos do Jordão

A Fase Sanatorial de Campos do Jordão teve início por volta de 1874 e foi perdendo fôlego até a década de 1980, quando a maioria dos estabelecimentos foram desativados.

“O terceiro volume – Estância Climatérica de Campos do Jordão: Sanatórios e Pensões e a Luta contra a Tuberculose – mostra como a região era procurada por pacientes, de vários locais do País e de fora dele, infectados pela Mycobacterium tuberculosis (bacilo de Koch). Na época, a tuberculose era responsável por quase 70% das mortes por doenças infecciosas no País e, desde 1880, já havia indicação da chamada “climatoterapia” pelo médico Clemente Ferreira, umas das vozes mais ativas na luta contra a doença, inspirado pela medicina germânica e dos tradicionais sanatórios na Suíça.” (1)

A Penicilina e o Declínio dos Sanatórios para Tuberculosos

Uma das informações mais interessantes e já esquecida ou desconhecida por muitos é que a tuberculose, doença pulmonar provocada pelo Bacilo de Koch, afligia milhares de brasileiros que viam como única chance de cura a internação em sanatórios que utilizavam o frio da região de Campos do Jordão para matar o bacilo causador de tanto sofrimento e mortes, porque os fármacos da época ainda não eram eficazes para tratar a doença. Essa realidade só mudou com a disseminação do uso de antibióticos que vieram a combater com efetividade o temido Bacilo de Koch, mas com isso também matou as dezenas de sanatórios que existiam em Campos do Jordão.

Com o passar dos anos, a prática da chamada climaterapia, tão em voga em Campos do Jordão e outras localidades, como a Suíça, perdeu força pela falta de evidências sobre sua eficácia. Além disso, a chegada dos antibióticos, nos anos 1940, revolucionou de verdade esse campo da medicina e permitiu que os indivíduos acometidos fossem curados com mais facilidade, porém não acabou com essa chaga histórica e alastrada no mundo todo.

“Após a Segunda Guerra Mundial, com a descoberta da penicilina, a procura pela Serra da Mantiqueira com finalidade terapêutica foi diminuindo. Atualmente, a climatoterapia já é considerada superada pela medicina. Gradativamente, porém, as pensões criadas para receber os pacientes deram lugar a hotéis e residências de férias.” (1)

Um Sanatório Congelado no Tempo

O Sanatório São Cristóvão permaneceu com sua estrutura incólume, que sofre com a poeira, com a ação do tempo e com alguns poucos atos de vandalismo relatados por Anderson Castro, que gentilmente nos recebeu no Roots Bike Park. Ele foi nosso mecânico de bike que salvou a viagem e ainda por cima se ofereceu para nos guiar nesse mergulho em um tempo muito diferente. São muitos os relatos e as informações interessantes de um lugar que exala história, e um pouco de insalubridade também. É visível a falta de qualquer tipo de limpeza. Tem-se a impressão de que tudo tenha sido desativo de um dia para o outro, como se todo mundo tivesse deixado as coisas lá no dia em que saíram e está assim até hoje.

O Sanatório São Cristóvão talvez seja o mais emblemático dos estabelecimentos para tratamento de tuberculose da época e o único a permanecer do mesmo jeito que era décadas atrás, apenas com encoberta pela poeira de anos sem qualquer tipo de limpeza no local, por isso mesmo ele proporciona uma viagem histórica única nos dias de hoje, pois é possível entrar na sala de raio X, refeitório, quartos, etc., como se estivéssemos fazendo uma viagem no tempo e entrando em um sanatório da época. Só faltam os internados e funcionários, mas é possível sentir a atmosfera de como funcionava o tratamento da tuberculose nos séculos passados.

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A Estrutura Grandiosa do Sanatório São Cristóvão

A estrutura na época do sanatório era muito maior que os 12 mil m2 de área construída podem sugerir. Havia salas de cirurgias, exames com aparelhos de última geração para a época, alas de luxo, alas mais populares, elevador, quadro de campainhas dos quartos, amplo refeitório, centro cirúrgico e um fluxo grande de pessoas, tantos de internados como de funcionários. A igreja era bastante frequentada. Existia necrotério, e o velório era ali mesmo. Tudo indica que o sanatório tinha uma vida social bem agitada e uma atividade econômica intensa, bem diferente do que é local hoje em dia. Além disso tudo, havia criações de porcos e galinhas para a alimentação os doentes internados que vinham, alguns deles, com toda sua família.

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O necrotério do Sanatório São Cristóvão
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A Igreja São Cristóvão hoje.

A Contribuição dos Sanatórios para a Colonização de Campos do Jordão (SP)

Grávidas davam à luz no próprio sanatório, muitos ficavam internados por muitos meses ou mesmo anos com sua família. O tratamento era um tanto demorado. Muitos dos que se curavam passavam a morar em Campos do Jordão e contribuíram assim com a colonização do município. Outros enfermos internados infelizmente não tinham a mesma sorte e eram sepultados longe de sua cidade natal, pois a família não tinha condições financeiras de retornar de onde vieram.

“Considerado terapêutico pelos médicos do período, esse clima gradualmente transformou o pequeno povoado “nos Campos do Jordão” em um centro urbano direcionado para receber pacientes em sanatórios, pensões e até residências.” (1)

Nem Todo Sanatório é para Doentes Mentais

Importante esclarecer uma confusão que muita gente faz quando se fala em sanatório. É que popularmente sanatório é sinônimo de hospício de loucos, de manicômio para doentes mentais. É comum até hoje alguém dizer que alguém está louco e precisa ser internado em um sanatório, pelo mesmo motivo, muitos estranham que doentes de tuberculose eram tratados em sanatórios.

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A fachada hoje do Sanatório São Cristóvão

A palavra Sanatório vem de sanar. No dicionário consta “Estabelecimento que recebe doentes para tratamento ou convalescença”, ou seja, é um lugar para sanar doenças, não propriamente mentais. É uma estrutura projetada para internação e um tipo de cuidado, que há algumas décadas deixou de tratar de tuberculosos e assim a grande maioria dos sanatórios ainda ativos no país são exclusivos para portadores de doenças mentais, o que aumenta ainda mais a confusão que se faz com o termo sanatório.

A Indicação Médica na Época de Ar Puro e Frio das Montanhas

Muito antes de se tornar destino turístico badalado no inverno, a cidade paulista de Campos do Jordão cresceu e ganhou fama por abrigar pacientes com tuberculose. Desde a segunda metade do século 19 acreditava-se que o ar frio e puro de suas montanhas era o melhor tratamento contra o Mycobacterium tuberculosis, o bacilo de Koch, bactéria que invade os pulmões e provoca danos potencialmente fatais, além de sintomas bem desagradáveis.

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Montanhas da Serra da Mantiqueira em Campos do Jordão-SP.

Em poucas décadas, foram construídas grandes e luxuosas casas de repouso para atender os clientes ricos, enquanto os mais pobres eram acolhidos em sanatórios mantidos por associações de caridade. “O fluxo de pessoas aumentou tanto que o governo do estado de São Paulo construiu na década de 1910 uma linha de trem até o município, a pedido dos famosos médicos sanitaristas Victor Godinho e Emílio Ribas”, conta a historiadora Ana Enedi Prince, da Universidade do Vale do Paraíba (SP), autora de quatro livros sobre esse período.

Tuberculose: Um Problema de Saúde Pública Mundial Ainda não Superado

Porém, engana-se quem pensa que essa moléstia seja um assunto superado: em pleno século 21, 70 mil brasileiros continuam a ser diagnosticados todos os anos com a condição — sete pessoas a cada hora! Desses, 4 500 morrem. No mundo, são 10 milhões de casos a cada 12 meses e 1 milhão de óbitos. Números tão expressivos fazem da tuberculose o quadro infeccioso que mais mata no planeta. É claro que esta estatística foi anterior à pandemia da Covid, mas em tempos normais a tuberculose faz mais vítimas fatais que a famigerada gripe.

Estima-se que de 1700 a 1900, a tuberculose tenha sido responsável pela morte de aproximadamente 1 bilhão de seres humanos. Antes da descoberta do bacilo de Koch, a taxa anual média de mortalidade era de 7 milhões de pessoas.

Os Avanços no Tratamento da Tuberculose

Além da esperança de tratamento e cura, a identificação do bacilo significou uma importante contribuição para o fortalecimento da teoria da transmissibilidade das doenças, que vinha se desenvolvendo com as pesquisas de Pasteur e de outros cientistas. A descoberta impulsionou novas tentativas em direção ao controle e tratamento específico da tuberculose, não apresentando porém, neste contexto, avanços significativos.

Como terapêutica para a tuberculose prevaleceu, desde o século XIX, o tratamento higieno-dietético, que tinha como pressuposto a cura espontânea do doente quando em condições favoráveis, traduzidas por uma boa alimentação e repouso e incorporando o clima das montanhas como um fator fundamental no tratamento. Sua indicação envolvia o isolamento dos pacientes, viabilizada por meio da criação de sanatórios e preventórios.

Vacina BCG

A primeira vacina contra a tuberculose bem sucedida foi desenvolvida, a partir de linhagens atenuadas da tuberculose bovina, por Albert Calmette e Jean-Marie Camille Guèrin, em 1906. A vacina BCG (Bacilo de Calmette e Guèrin) foi usada pela primeira vez em humanos em 1921, na França.

Aplicada logo nos primeiros dias do bebê, ela é essencial para evitar os quadros mais graves de tuberculose na infância. A injeção costuma deixar uma marquinha no braço, que muitas pessoas carregam pelo resto da vida.

by Rudi Arena

Tuberculose: do suplício à inspiração literária *

As novas gerações não imaginam que durante bastante tempo a doença mais fatal no mundo inspirasse a produção de poetas e escritores, o enaltecimento deles à beleza das tísicas e a aparências doentes e miseráveis oriundas do autoabandono. A tuberculose, causadora da morte de 1,5 milhão de pessoas por ano, segundo a OMS, infernizou a vida de muitos deles no século 19 e mais da metade do século 20, pois muitos a contraíram a ponto de morrer ou terem a saúde devastada. A tendência deles à depressão profunda surtia, na grande maioria dos casos, em vida desregrada, sem condições de higiene, regada a álcool, encafifada no fumo e carente de alimentação. Um quadro de vulnerabilidade extrema, típico para o Mycobacterium tuberculosis – bacilo motivador da tuberculose – realizar estragos.

   A lista de poetas e escritores famosos que tiveram tuberculose é imensa, como Nelson Rodrigues, Manuel Bandeira, Casimiro de Abreu, Castro Alves, Cruz e Sousa, Álvares de Azevedo, Emily Brontë, John Keats, Lord Byron e Friedrich Schiller. Fora dela, outros expressaram seus sentimentos em relação a seus amores, parentes e amigos portadores da doença. Os versos e relatos geralmente transmitiam sofreguidão, mas vários encontraram espaços para expor fina ironia. A riqueza de detalhes serve também para marcar historicamente tempos em que as alternativas de terapêutica eram restritas a sanatórios distantes e próximos da natureza, a alimentação era à base, sobretudo, de feijão, os doentes eram submetidos a terríveis exames e procedimentos, no início dos anos 20, como o pneumotórax, no qual uma agulha penetrava entre os vãos da costela para injetar ar, a toracoplastia, para afastamento ou extração cirúrgica de costelas, e a hemoptise, a fim de expulsar o sangue pela boca.

O período literário com maior exaltação à tuberculose foi o do Romantismo no século 18, principalmente pelo movimento conhecido como Mal do Século, originário da região anglo-saxônica, e idealizado no Brasil por diversos poetas considerados mórbido-pessimistas. Com base no culto do eu, expressavam, segundo o “Dicionário de Termos Literários”, de Moisés Massaud,  extremo pessimismo, sensação de perda de suporte, apatia moral, melancolia difusa, tristeza, culto do mistério, do sonho, da inquietude mórbida, tédio irremissível, sem causa, sofrimento cósmico, ausência da alegria de viver, fantasia desmesurada, atração pelo infinito, desencanto em face do cotidiano, desilusão amorosa, nostalgia, falta de sentimento vital, depressão profunda, abulia, resultando em males físicos, mentais ou imaginários que levam à morte precoce ou ao suicídio.

Imagine esses ingredientes somados à tuberculose, casos dos poetas mórbido-pessimistas Castro Alves, Álvares de Azevedo e Casimiro de Abreu, mortos quando ainda estavam na fase dos 20 anos por causa da enfermidade.

Verdadeiros desabafos em forma de versos sobre a vida indo embora:

Eu sei que vou morrer… dentro do meu peito /
um mal terrível me devora a vida. /
Triste Assaverus, que no fim da estrada /
só tem por braços uma cruz erguida. /
Sou o cipreste qu’inda mesmo florido /
Sombra da morte no ramal encerra! /
Vivo – que vaga entre o chão dos mortos, /
Morto – entre os vivos a vagar na Terra.

“Mocidade e Morte”, de Castro Alves, falecido aos 24 anos.

 Descansem o meu leito solitário /
Na floresta dos homens esquecida /
À sombra de uma cruz e escrevam nela: /
Foi poeta, sonhou e amou a vida.

Trecho de “Lembranças de Morrer”, de Álvares de Azevedo, que morreu aos 21 anos.

 Eu sofro; o corpo padece / 

E minh’alma se estremece /
Ouvindo o dobrar de um sino (…)

A febre me queima a fonte /

E dos túmulos a aragem /
Roça-me a pálida face /
Mas no delírio e na febre /
Sempre teu rosto contemplo / 

Trechos do poema “No leito”, de Casimiro de Abreu, que sucumbiu aos 23 anos.

Augusto dos Anjos, outro poeta mórbido-pessimista a quem se atribuiu erroneamente ter sido tísico, morreu jovem em 1914 de pneumonia e ficou sem pai em 1905 por tuberculose. Em duas quadras de longa poesia, ele externou sua percepção sobre esse mal.


Falar somente uma linguagem rouca, /
Um português cansado e incompreensível, /
Vomitar o pulmão na noite horrível /
Em que se deita sangue pela boca! /
Expulsar aos bocados, a existência /
Numa bacia autômata de barro /
Alucinado, vendo em cada escarro /
O retrato da própria consciência…

Poesia “Os doentes”, de Augusto dos Anjos, falecido aos 30 anos

Fina ironia

Também no Modernismo, movimento literário e artístico do início do século 20 que visava, a partir do rompimento com o tradicionalismo, à liberdade estética, à experimentação constante e à independência cultural do país, a tuberculose resultou em abrangente literatura. E quem mais a incorporou foi Manuel Bandeira, conhecido como o ‘Poeta Tísico’ por escrever: “Mas então não farei mais nada porque em mim o poeta é tuberculose. Eu sou Manuel Bandeira, o Poeta Tísico”. Devido à doença, o Brasil ganhou um dos seus mais expressivos poetas, já que aos 18 anos, em 1904, deixou os planos de ser arquiteto após saber que estava com tuberculose. Submeteu-se durante 15 anos a tratamentos baseados no clima e altitude em cinco cidades brasileiras e no Sanatório de Cladavel, na Suíça. A ‘sentença de morte’ que significava à época a tuberculose fez da enfermidade inspiração para boa parte de seus escritos, mas ele resistiu até ficar bastante idoso e faleceu por hemorragia digestiva alta. Entre seus poemas figura o seguinte:

Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos, /
A vida inteira que poderia ter sido e não foi. /
Tosse, tosse, tosse. /
Mandou chamar o médico. /
Diga trinta e três. /
Trinta e três… trinta e três… trinta e três… /
Respire /
O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo /
e o pulmão direito infiltrado. /
Então doutor, não é possível tentar o pneumotórax? /
Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Poema “Pneumotórax”, de Manuel Bandeira, morto aos 80 anos

A descrição literária mais crua sobre a vida de portadores de tuberculose em sanatórios saiu da vivência do dramaturgo, jornalista e teatrólogo Nelson Rodrigues quando ele se tratava da doença na estância climática de Campos de Jordão, em São Paulo, a mais procurada no Brasil para tal finalidade até a primeira metade dos anos 1900. Ele ficou de abril de 1934 a junho de 1935 num Sanatorinho Popular, onde, em 1935, escreveu o seu primeiro texto dramático. Para ele, o sanatório, de forma geral, se tratava da “casa dos mortos”, principalmente por se queixar de solidão ao perceber a escassez de correspondências para ele. Também reclamava dos inúmeros pneumotórax para examiná-lo. A tuberculose foi implacável em relação a Rodrigues: teve 70% de sua visão reduzida, perdeu o irmão Joffre por consequência da doença e chegou à velhice com várias mazelas até morrer em 1980, aos 68 anos de idade, em decorrência de complicações cardíacas e respiratóriasSeu desabafo na publicação “Memórias”, de 1967, expõe a vulnerabilidade à tuberculose.

        “Não tinha roupa, ou só tinha um terno; não tinha meias, e só tinha um par de sapatos; trabalhava demais e quase não dormia; e, quantas vezes, almocei uma média e não jantei nada? Tudo isso era a minha fome, e tudo isso foi a minha tuberculose”, escreveu Rodrigues.

        A tuberculose também foi bem retratada pela romancista, contista e cronista Dinah Silveira de Queiroz em 1949, quando escreveu o romance “Floradas da Serra”, baseado no romance de homem e mulher que se conhecem numa clínica para tratamento de tuberculose em Campos de Jordão. Em sua narrativa, descreveu o isolamento de adolescentes recolhidas em uma pensão para moças em Campos de Jordão. Em 1954, o italiano Luciano Salce dirigiu filme homônimo baseado nessa obra.

* https://www.fundacaoataulphodepaiva.com.br/blog/tuberculose-do-suplicio-a-inspiracao-literaria-2/

Fontes:

(1) https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-humanas/campos-do-jordao-epidemia-de-tuberculose-deu-origem-a-cidade-sanatorio-que-hoje-e-destino-turistico/

https://recantosaocristovao.com.br/o-hotel/

http://www.ccs.saude.gov.br/peste-branca/tb-historia.php

https://saude.abril.com.br/medicina/tuberculose-a-infeccao-mais-mortal-do-mundo/

https://www.fundacaoataulphodepaiva.com.br/blog/tuberculose-do-suplicio-a-inspiracao-literaria-2/

Piramba MTB no Roots Bike Park

A Localização

No primeiro dia de pedal da Expedição à Campos do Jordão do Piramba MTB em maio/2021 resolvemos conhecer o Roots Bike Park que fica localizado próximo a 1700 m de altitude e fica a 800 metros do Portal da cidade e a 50 metros do Centro de Lazer Tarundu e ao lado do Hotel São Cristóvão. No dia anterior havia chovido bem, no caminho havia uma ou outra poça d´água e um pouco de barro ainda restava na pista, logo, a atenção tinha que ser maior ainda nas partes mais técnicas.

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Um Anjo Salvador

Porém, a minha bike e a de um outro amigo quebraram logo no começo. Que azar!!! O problema da minha bike foi o frehub ou roda-livre que é um tipo de cubo de bicicleta que incorpora um mecanismo de catraca, e para ajudar o meu pedal soltou e caiu no chão, frustrante, logo no primeiro dia, e ainda por cima iria ficar sem bike para pedalar os próximos dias. Por outro lado, o meu amigo quebrou a gancheira, mas no caso dele, o mais que gente boa Anderson Castro emprestou uma bike que tinha no Roots Bike Park destinada para aluguel.

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Já o meu caso estava mais complicado de resolver, mas como existe uma oficina para pequenos reparados, o Anderson tentou arrumar o meu frehub, mas ele estava em estado deplorável e conserto não dava certo, mas ele não desistiu, pegou umas peças usadas que tinha e arrumou o freehub com sucesso, também me arrumou um novo pedal e instalou na hora. Agora sim, a bike estava pronta para percorrer as tilhas iradas do bike park. E ainda por cima, o incrível Anderson Castro não cobrou nada pelo serviço e nem pelas peças do freehub, acabei pagando um valor módico pelo pedal e o agradeci muito. Ele salvou não só o o meu pedal naquele dia, mas também para os próximos dois dias de mountain bike. Ele merece todos os agradecimentos.

Dificuldades das Trilhas

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As trilhas no Roots são divididas por cores, Amarelo, Verde, Laranja, Azul, Vermelho e Preto, em ordem crescente de dificuldade. Embora tenha algumas trilhas com nível de dificuldade baixo, em geral, o Roots Bike Park possui trilhas bem técnicas e obstáculos similares ao que se encontra na natureza bruta das trilhas de MTB, também tem um circuito de XCO bem legal. A pista muitas vezes exige bastante técnica do ciclista, são necessárias mudanças rápidas de marchas, frenagens precisas, são muitas as curvas fechadas ou inclinadas, degraus, trechos de trilha bem estreitos e trechos de terreno com muitas raízes que exige atenção. Também é necessário muita força na perna, tem subidas pesadas, muitas vezes é necessário frear tudo para em seguida subir.

São muitos os desafios, obstáculos e estruturas de madeira para exercitar variadas técnicas, até mesmo para treinar jumps e equilíbrio. A pista possui algumas pontes de madeira, e uma em especial é muito legal e simula uma WallRide, mas em um ângulo menor que 90º. Talvez, o maior desafio e a cereja do bolo seja os Rock Gardens, que em tradução literal seria Jardim de Pedras. Tem um com pedras bem grandes e um desafio e tanto para passar ileso. É claro que um tombo ali seria normal, e é óbvio que isso aconteceu com um pirambeiro nosso, mas nada demais, todo desafio tem lá seus riscos, não é?

O Visual

O visual é o bike park é muito bonito, com vegetação típica daquela região, muitas araucárias, a trilha também passa por uma bela lagoa com patos, e encontrei lá muitos pássaros e também um cogumelo muito conhecido mundialmente, mas raro no Brasil. Ele é comum nas regiões frias do hemisfério norte, mas tem ocorrência natural no outono, em regiões montanhosas da Serra da Bocaina e da Mantiqueira, entre São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, bem como em algumas localidades dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul de clima frio.

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A Amanita Muscaria, é aquele cogumelo de de desenho animado de chapéu vermelho e bolinhas brancas, e que aparece em clássicos como Alice no País das Maravilhas ou o filme Fantasia (Disney) e no game do Super Mário Bross. Porém, muito cuidado, sua ingestão pode desencadear distúrbios digestivos, taquicardia ou alucinações.

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Zoom Bike Park X Roots Bike Park

É natural a comparação entre os dois Bike Park de Campos do Jordão, já que o Piramba MTB em outra ocasião também conheceu o Zoom Bike Park. Para começar percebi uma diferença de propósito da cada bike park, e também de preço, o valor no Roots é mais barato e o seu estilo é raiz mesmo. Porém, é preciso reconhecer que O Zoom este tem uma maior estrutura , o terreno do Park é maior e as trilhas são mais bem organizadas e separadas umas das outras. O Roots Bike Park faz jus ao nome, as trilhas são mais truncada e bem técnicas, já no Zoom as trilhas são mais limpas, abertas e fluem mais.

Porém, no quesito atendimento e oficina de reparos, o Roots Bike Park se diferenciou pela qualidade e acolhimento. Fomos muito bem atendidos pelo Anderson Castro, diferente da experiência que tivemos no Zoom Bike Park. E ainda por cima, no entorno do Roots Bike Park existe uma pequena capela e também uma pequena Igreja que em tive o privilégio de primeira vez ter a sensação de tocar o sino do templo. A experiência como um todo muito legal.

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Sobre o Anderson e Drika do Roots Bike Park

E também é muito bacana a história dele no mountain bike. Ele foi campeão Brasileiro em 1996, e já esteve no pódio em muitas das mais duras provas de mountain bike, como Iron Biker, Canastra Ride, Mundial na Austrália, Panamericano na Argentina, as famosas provas de 24 horas, tendo sido um dos brasileiros classificados para o Mundial dessa modalidade. O Roots também conta com a Drika, “Mountain biker desde 1996, correu perto de 40 provas de aventura, algumas provas de mountain bike, e atravessou a América do Sul em 2008, num total de 24 dias, sendo 21 dias pedaladas! Trilheira rústica!”

Ao final, o Anderson ainda compartilhou todo o seu conhecimento histórico e nos serviu como um excelente de guia para uma viagem ao passado de Campos do Jordão com curiosidades fascinantes, que com certeza vale a um postagem em separado sobre o assunto.

By Rudi Arena

O ROOTS BIKE PARK é a mais nova opção para os Mountain Bikers se divertirem em Campos do Jordão-SP. Em meio a muito verde e com um visual lindo demais, a quase 1800m de altitude, há varias trilhas de diferentes níveis, e também um circuito XCO (7,0km) incrível, com acumulado de 230m. Temos trilhas para vários níveis de aventureiros, do iniciante ao profissional. O biker tem a opção de repetir o trecho que mais gosta quantas vezes quiser, fazendo trilhas e voltas diferentes cada vez.

Adrenalina, diversão e superação de limites na certa!

Guarantã pela Fazenda Coqueirão e sua Linda Capela Abandonada

Um Pedal com muito areião, vento contra e sol escaldante, mas também uma bela capela e lindas paisagens.

O pedal de Garça até a cidade de Guarantã-SP dá pouco mais de 50 km,  mas este dia em específico foi extremamente desgastante, fazia muito mais de mês que não chovia uma gota, tempo muito seco, foram muitos os trechos de areião pesado, e um sol de rachar mamona, e para ajudar, tinha um vento contra muito forte, em alguns momentos até se assemelhava a uma tempestade de areia que chegava a ofuscar a visão.

O caminho percorrido foi da estrada de terra que passa pela Corredeira que é repleta de belas paisagens e que também leva até a cidade de Pirajuí, porém, para chegar ao nosso destino, antes de Pirajuí, é preciso pegar uma opção a esquerda quando aparece uma bifurcação.

Pouco depois, já é possível avistar de longe em meio ao canavial uma bela construção próximo a estrada de terra, e que vale a pena uma visita. Trata-se da linda Capela da Fazenda Coqueirão. A construção tem mais de 100 anos, e infelizmente os sinais de abandono estão por todas as partes, a ponto da raiz de uma árvore já ter desmanchado boa parte do piso de tacos de madeiras da entrada da edificação.

A história desta capela está intimamente ligada a estação ferroviária que foi inaugurada em 1912  em razão do desenvolvimento econômico da Fazenda Coqueirão, sinal de que a propriedade rural tinha muitos habitantes e movimentava bastante a economia local, na época baseada na cultura do Café.

Infelizmente esta fazenda que era gigantesca entrou em decadência com a crise econômica mundial de 1929 e depois com o café perdendo força na economia, e a situação piorou mais ainda em 1948, ano em que a estação ferroviária mudou de lugar. Assim, o café acabou dando lugar a cana-de-açúcar e o número de trabalhadores da Fazenda Coqueirão foi caindo drasticamente, bem como a sua importância para a economia local.

Rudi Arena

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Capela da Fazenda Coqueirão

Localização 21° 57′ 49.35″ S 49° 33′ 39.04″ W Esta é uma das poucas construções que sobrou da Fazenda Coqueirão Guarantã – SP. Pouco se sabe da história desse lugar, cercada com um muro de placa, em volta de uma plantação de cana de açúcar, a capela sobrevive ao tempo mesmo abandonada. Diz a história que nesta fazenda foi inaugurada em 1912, uma estação ferroviária da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil com o nome de Cincinato Braga, havia ali um campo de futebol, um pequeno cinema, uma colônia de casas, a sede da fazenda, e até um cemitério, e também essa igreja. Ao lado ficava localizada uma avenida de terra, cercada de paineiras que ligava a fazenda ao na época distrito de Guarantã, pertencente ao município de Pirajuí. Dentro da igreja tem uma cruz de madeira com os dizeres ” Lembrança das Santas Missões” e a data 10/06/1945. Em 1948 esta estação era desativada devido ao novo trecho da estrada de ferro, que também passava em terras da Fazenda Coqueirão. No começo da década de 50 o café foi trocado pelo gado, não tendo a necessidade de tanta gente morando em fazendas, a própria Coqueirão chegou a ter mais de 4.000 alqueires de pasto, e gado trazido do Mato Grosso do Sul por vagões de trens. Atualmente essa fazenda não é assim tão grande, já foi invadida, dividida, surgindo um assentamento do MST, parte vendida, e hoje aparentemente o que sobrou arrendada para plantio de cana de açúcar.

Fonte: https://www.flickr.com/photos/erichenrique/

Um bom vídeo para quem quer conhecer mais sobre a Capela:

Um pouquinho da História do Município de Guarantã-SP

Distrito criado com a denominação de Guarantã, por Lei Estadual nº 2025, de 27 de dezembro de 1924, no Município de Pirajuí.

Elevado à categoria de município com a denominação de Guarantã, por Decreto-lei Estadual no 14334, de 30 de novembro de 1944, desmembrado de Pirajuí e Garça.

Fonte: https://www.guaranta.sp.gov.br/